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A disputa pelo voto evangélico: a dura batalha entre Bolsonaro e Lula para 2022

Os sinais de uma polarização política no próximo ano são cada vez mais evidentes, com a antecipação do debate que deve ser travado na seara eleitoral. Mas a divulgação das últimas pesquisas eleitorais, que mostram um suposto empate entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-presidente Lula (PT) no eleitorado evangélico, colocou ainda mais ‘fogo’ na discussão política, de forma antecipada.

De acordo com a mais recente pesquisa DataFolha, se as eleições fossem hoje, o presidente Jair Bolsonaro teria 38% das intenções de voto, e o petista, 37%, entre evangélicos. Os números sugerem um movimento diferenciado,  com um cenário totalmente diferente daquele concretizado em 2018, quando cerca de 70% deste público votou no atual presidente.

Estando os números corretos ou não, há uma verdade: a disputa pelo voto evangélico deve ser dura, marcada por discursos inflamados, em busca do apoio de mais de 42 milhões de pessoas que, de acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), já pertenciam a este segmento em 2010. Sabendo disso, Jair Bolsonaro e Lula da Silva já preparam suas armas para angariar a preferência desse eleitorado.

‘Brasil acima de tudo, Deus acima de todos’

Apesar de ser Católico, o presidente Jair Bolsonaro foi abraçado por evangélicos em 2018, tendo até hoje ligações com os principais líderes desse segmento do país. Conforme levantamentos, 7 de cada 10 evangélicos votaram em Bolsonaro em 2018. Com o lema ‘Brasil acima de tudo, Deus acima de todos’, ganhou adeptos de cristãos e conservadores, que viram nele a chance de ‘barrar’ pautas liberalistas no Congresso Nacional, a exemplo da chamada ‘ideologia de gênero’ nas escolas ou de restrições às liberdades de cultos.

Apesar de ser o grupo evangélico bastante diversificado, Bolsonaro conta com amplo apoio de líderes, das mais variantes correntes teológicas, desde os pentecostais (os mais numerosos), passando pelos neo-pentecostais até os protestantes históricos. Da linha pentecostal, destacam-se: José Wellington da Costa Júnior (da Convenção Geral das Assembleias de Deus), Samuel Câmara (da Convenção das Assembleias de Deus), Samuel Ferreira (Convenção Nacional das Assembleias de Deus) e Silas Malafaia (Assembleia de Deus Vitória em Cristo), este último o mais destacado aliado presidencial.

Igualmente aliados a Bolsonaro, são pastores neo-pentecostais (mais distantes do evangelicalismo tradicional, ligados aos mega-templos e às programações televisivas), a exemplo de Edir Macedo (Universal do Reino de Deus), Apóstolo Valdomiro (Mundial do Poder de Deus) e RR Soares (Internacional da Graça de Deus).

Na outra ponta, protestantes históricos também seguem apoiando o presidente, a exemplo dos presbiterianos, que ocupam cargos no Governo Federal. É o caso do ministro da Educação, Milton Ribeiro, e do Advogado Geral da União, André Mendonça. Este último, indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF) como um ‘terrivelmente evangélico’, como prometeu Bolsonaro reiteradamente.

Para Rafael Durand Couto, advogado, pós graduado em Direito Público, especialista em Direito Religioso e membro fundador do Núcleo de Estudos em Política, Cidadania e Cosmovisão Cristã (NEPC3), nesta ‘disputa’ Bolsonaro poderá repetir o feito de 2022, mas Lula tentará furar o bloqueio a partir de suas bases eleitorais.

Na avaliação dele, a indicação de André Mendonça para o STF é “mais um grande gesto favorável a este público”, o que deve intensificar o apoio do segmento ao presidente no próximo ano, além do apelo às pautas conservadoras.

“Outro fator que pesa a favor de Bolsonaro é “a participação em eventos de grandes denominações evangélicas, bem como agendas com líderes das grandes igrejas do Brasil, tanto as neopentecostais, tais como a Igreja Universal do Reino de Deus, a Igreja Mundial, entre outras, bem como junto às pentecostais clássicas, como a Assembleia de Deus, além das igrejas chamadas de reformadas históricas, como a Igreja Presbiteriana do Brasil. O discurso a favor de pautas cristãs (liberdade religiosa, família, defesa do nascituro, etc.) também será reforçado”, disse.

Em quase todas as suas intervenções públicas, em inaugurações ou lives realizadas no Facebook, Jair Bolsonaro faz questão de mencionar a ligação que afirma ter com Deus, ressaltando também uma afinidade com valores judaico-cristãos que, segundo ele, devem ser preservados.

Na última semana, ao indicar André Mendonça para o STF, Bolsonaro voltou a dirigir-se aos evangélicos. “Sou católico, minha esposa (Michele) é evangélica, acredito em Deus. Temos um presidente que acredita em Deus, respeita seus militares, defende a família e deve respeito absoluto a seu povo”, repetiu o presidente.

Lula: um apelo ‘econômico e social’ aos evangélicos

Antes mero expectador, Lula passou a tentar abrir um canal de diálogo com os evangélicos, principalmente nas redes sociais. O petista passou a usar com mais frequência a palavra ‘Deus’, em contestações a Jair Bolsonaro, apontando um suposto contraste entre o discurso do presidente com a política econômica adotada pelo ministro Paulo Guedes.

“Não acredito em um cristão que utiliza o nome de Deus em vão. Inclusive se o Bolsonaro acreditasse em Deus ele não mentia tanto, não pregava tanta discórdia, tentando tirar proveito da fé do povo evangélico. Deus tá vendo tudo que a gente faz”, disse.

Em outra publicação, afirmou: “Nem militar nem evangélico tem que ser tratado como gado. Vamos fazer discurso pro cidadão. Trato evangélico com o mesmo respeito que trato católico e trato militar com respeito que trato o civil. Quem vai votar é o cidadão”, escreveu recentemente no Twitter.

Conforme o entendimento de Rafael Durand, para tentar furar esta barreira eleitoral, Lula venderá a imagem de “Justiça Social” dos governos petistas. Isso porque, segundo ele, “historicamente, a esquerda tem agido assim junto ao público cristão, tanto na igreja católica com a teologia da libertação, como no meio evangélico com a TMI (teologia da missão integral)” – ambas com foco em questões sociais.

O petista também usará o apoio de alguns pastores de esquerda como Ariovaldo Ramos, Henrique Vieira, entre outros, para tentar ganhar votos de evangélicos, mas não terá vida fácil.

“a esquerda representada por Lula, também poderá trazer temas que sensibilizam os cristãos evangélicos, como o cuidado com os mais pobres e a justiça social. Porém, Lula carrega consigo a questão da corrupção e pautas totalmente anticristãs, como o aborto, a ideologia de gênero, o fechamento das igrejas. Além disso, o radicalismo das últimas manifestações a favor de Lula e contra o Presidente também estão no imaginário das pessoas como algo que os evangélicos não querem para a nação”, explicou Durand.

Direitos Humanos no Governo Bolsonaro

Outro fator que deve ser levado em consideração, é que, no Governo de Jair Bolsonaro, há integrantes evangélicos que enfatizam pautas sociais, a dignidade humana e os Direitos Humanos. Certamente, um tema que será levado em conta na discussão eleitoral e que a esquerda terá que “dividir” em 2022.

É o caso do pastor da igreja Cidade Viva, Sérgio Queiroz, atual secretário especial de Modernização do Estado, cargo vinculado à Secretaria Geral da Presidência.  Paraibano, é um protestante histórico, que já ocupou os cargos de Secretário Especial do Desenvolvimento Social (vinculado ao Ministério da Cidadania) e de Secretário de Proteção Global dos Direitos Humanos, sob o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MFDH).

O Ministério da Mulher, inclusive, é comandado por Damares Alves (também pastora, e pentecostal), que defende enfaticamente temas relacionados aos Direitos Humanos nas redes sociais, sobretudo àqueles relativos às mulheres, às crianças vítimas de violência e às pessoas com deficiência.

Para o advogado Hertz Pires Júnior, mestrando em Ciência Política pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) e graduando em Teologia pelo Instituto Teológico Superior de Missões (ITESMI), a forma como os governos e partidos lidaram com a religião durante a pandemia da Covid-19, inclusive impondo restrições, também refletirá no voto.

“É provável que além das pautas acima para compor o voto dos evangélicos, tenham-se acrescido à isso os episódios que chicoteiam a liberdade de culto, a manifestação religiosa e a possibilidade de congregar de forma presencial. Assim, em virtude dos constantes embates entre os dois grupos, possivelmente existe um grande apoio dos evangélicos à reeleição do Presidente Jair Bolsonaro”, disse.

Uma questão de sensibilidade

Em resposta ao Polêmica Paraíba, o cientista político Luiz Gonzaga Júnior afirma que a matemática eleitoral em 2022, neste aspecto, não será simples. Ele ressaltou a diversidade do meio evangélico e lembrou que dois pontos centrais poderão influenciar o voto deste público: os valores inerentes ao cristianismo, mas também as políticas públicas implementadas no país, num contexto de crise política e social.

“A eleição já começou. Por um lado, Bolsonaro tenta manter e fidelizar boa parte desse segmento religioso, que lhe acompanhou em 2018, mas também não se pode deixar de levar em consideração a relação que Lula tinha com esse segmento em seu governo, e começa a abrir canais de diálogo com esse segmento”, considerou.

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Da Redação
com PolêmicaPB
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